Reflexão

Sobre dividir o tempo com quem a gente quer bem

15/10/2016

amizade

Quando era mais nova, minha ideia de amizade era assim: conhecia uma menina, a gente começava a conversar, via que se dava bem e não se desgrudava nunca mais – mentira, esse momento sempre chegava e geralmente vinha acompanhado de alguma treta (desde “você sempre quer ser a Victoria quando a gente imita as Spice Girls” até “nada a ver você querer ser amiga do meu ex-peguete, né”).

Lembro bem da última vez que isso me aconteceu, lá por 2012. A gente fazia tudo juntas: ia pra balada, assistia filme, fazia compras, pintava as unhas, viajava. Quando eu dei por mim, já não sabia que parte dela era minha e que parte minha era dela. Mais uma vez, uma daquelas simbioses cansativas em que ninguém se reconhecia mais – só sobrava a massa amorfa do “nós”.

Não deu certo, claro. Brigamos feio. Foi péssimo. Mas foi ali, no auge dos meus vinte e tantos anos, que finalmente percebi: esse tipo de amizade nunca vai funcionar (pelo menos não pra mim). Foi assim que, num golpe extremamente geminiano, me dei mais chances de conhecer as outras pessoas ao meu redor de verdade. Sem pressão, sem precisar falar todo dia, sem o lance de melhores amigas para sempre.

Passei a entender que, mesmo que tenha uma amizade fiel (como a que tenho com a Sacha, minha amiga há 15 anos ininterruptos), a vida se encarrega de levá-la de mim, mas também a devolve como um presente que eu abro de novo. Tudo a seu tempo, tudo como tem que ser. Não adianta querer manter as coisas dentro da caixinha como se elas nunca fossem mudar – como se eu não fosse mudar.

Às vezes aquela melhor amiga da infância casa, constrói um sobrado, adota um cachorro. Enquanto isso, você está curtindo a vida de solteira, morando com os pais e pensando em mudar de país. E a vida é assim, movimento. E se as duas partes ainda têm sincronia, é preciso aproveitar. Mas, se não têm, é hora de deixar passar – sem se esforçar pra colorir aquela foto que está desbotada pelo tempo.

A gente sempre pode tirar uma nova. Com a mesma pessoa, um dia, mas também com outras. Aliás, uma não: a gente pode tirar várias. É assim que me permito viver hoje. Minha cores se juntam com a de outras pessoas – e juntas fazemos um retrato único. Não tem o mais bonito, não tem o que me faz sorrir mais. São passagens, são aprendizados, são trocas.

Um dia estou ali, comendo pizza com uma amiga querida, sua mãe e sua avó. As quatro, sentadas na mesa, conversando até 5 da manhã. No outro, dou um abraço apertado na minha prima que veio me fazer uma visita. Depois, vou visitar a amiga que acabou de ter bebê. É assim: a gente espalha por aí nosso amor e nossa presença. E recebe manifestações de todos os tipos de volta. A gente vive, afinal.

Foto: Shutterstock

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30 comentários

  • responder Juliana 15/10/2016 às 09:49

    Nossa Thais, eu com quase trinta anos penso exatamente da mesma forma, já larguei mão de muita amizade que tentei até o fim e já não me agregava nada de positivo, aprendi a dar valor e a dedicar meu tempo as pessoas que eu ainda posso acrescentar alguma coisa positiva e as que me traz isso também. Com a correria da vida “adulta” temos que aprender a nós valorizar, valorizar nosso tempo e as pessoas que amamos e nos amam também.
    Muita luz para vcs lindas que estão sempre trazendo alegria aos meus dias. Obrigada!

  • responder Ana Luisa de Paula 15/10/2016 às 10:05

    Thaís, sabe que minha mãe sempre teve essa vida “desapegada ” de amizades, e acho que herdei isso dela. Quando era menor, me sentia meio “isolada” por não ter uma Bff- hahahaha-com o passar do tempo vi que isso não faz menor diferença. Tenho uma grande amiga( uma das poucas que tenho contato desde o jardim) uma vez me deu um livro que tem a seguinte frase:” amizade não é os minutos gastos nas conversas ao telefones diariamente , os encontros diários ou as viagens feitas juntas. Mas, sim a capacidade de fazer com que ao se encontrar parece que o tempo não passou”.
    Beijos

  • responder Alba 15/10/2016 às 11:38

    Oi, Thaís!
    Amizade é, de fato, uma experiência de vida, e como tal, você conhecerá pessoas com as quais terá ou não afinidade o tempo todo. Faz parte da nossa atividade social, e o que aprendi com isso é que não se deve esperar nada de ninguém, tampouco gerar nos outros,expectativas a nosso respeito. É algo difícil? Sim, mas não é impossível, e é o que nos faz amadurecer em nossas relações interpessoais. Eu tenho 41 anos e posso te afirmar que já passei por muitas experiências de amizades, desde as mais surpreendentes, no sentido positivo, quanto no negativo, até receber apoio no num momento difícil de pessoas que sequer são próximas.
    O bom de viver é poder aprender com tudo isso.
    Que muitas experiências boas ainda venham para você em sua jornada na Terra!
    Abraços!

  • responder Márcia Daniella 15/10/2016 às 11:51

    Que reflexão linda, Thais. Tem um episódio de How I met your mother que trata disso, quando a melhor amiga da Robin no Canadá aparece e interage com a turma. A reflexão sobre a amizade foi linda nesse episódio.

  • responder Myrian 15/10/2016 às 11:52

    Bom, isso é viver e se relacionar com maturidade, com sabedoria. Eu não tenho amigas, apenas conhecidas ou colegas de trabalho. Não sei direito como me tornei esse bicho estranho, antissocial. Acho que, por ser na juventude muito agressiva, rebelde sem causa, me fechei em copas para defender as pessoas de mim e para me defender das pessoas. Pior pra mim, que não vivi intensamente relações de amor, amizade. Apenas passo por elas, superficialmente. Saio sim, sem nenhum arranhão, mas, em compensação não há troca. Hoje luto para quebrar a minha armadura e acho que estou conseguindo porque hoje eu sofro, me magoo com as pessoas que me agridem com palavras (geralmente as da minha família que é bastante complicada) mas é exatamente nesse ponto que desejo chegar. Relacionamentos de amizade, amor, sem expectativas boas ou más, apenas estar aberto para todos que se aproximarem de mim, ver qual é, sem medo.
    Lindo texto Thaís,
    Bjs.

    • responder Thais Marques 02/11/2016 às 19:35

      Myrian, desejo muito amor e boas experiências na sua caminhada! <3

  • responder Daniella 15/10/2016 às 12:48

    Eh engraçado, hoje aos 30 anos eu vejo exatamente da forma como o texto diz. Minhas grandes amigas casaram, tem filhos, algumas se mudaram pra longe por causa da profissão e outras simplesmente sumiram com o tempo. A vida eh muito dinâmica e se a gente não estiver sempre disposto a andar pra frente, independente de quem vá com a gente, mergulhamos num mundo de tristeza e solidão e eh isso que nunca pode acontecer. Hoje divido meu tempo com colegas, um aqui e outro ali, bem mais superficialmente e os amigos mesmo encontro uma gez por ano naquelas reuniões que só se faz de vez em quando. Hoje a minha realidade de solteira por aí não combina mais com o estilo e muita das vezes nem com os assuntos delas. Belo texto.

  • responder Pat 15/10/2016 às 13:07

    Parabéns pela sensibilidade e maturidade, Thais. Obrigada por compartilhá-las conosco. Beijo.

  • responder Manu 15/10/2016 às 14:36

    Amei o texto… concordo super. Muitas vezes tenho preguiça de marcar um encontro, mas todas as vezes que venci essa barreira, o reencontro é muito gratificante. Amizade, pra mim, e doação e nada tem a ver com proximidade física.

  • responder Xica 15/10/2016 às 23:33

    Uauu!!! Texto lindo e caiu como uma luva pra mim nesse momento que estou passando! Sempre leio o blog mas não sou de comentar, mas tive que falar dessa vez!
    Na adolescência fui o tipo de pessoa que fazia de tudo para não magoar as “amigas”, e com o tempo percebi que na vdd nunca foram amigas de verdade e eu que dava importância demais. Na faculdade fiz grandes amigas, de verdade , parceiras para tudo, mas há uns dois anos mais ou menos cada uma casou e seguiu sua vida e hj em dia nos encontramos as vezes, mas sem perder o contato virtual. Fiquei sozinha e tentei construir laços de amizade com algumas colegas de trabalho, mas descobri que somente eu estava doando minha amizade de novo e elas mais combinavam coisas entre si e me deixavam de fora e vinham puxar papo qdo era de interesse. Acabei caindo fora, tipo converso e tal mas já não coloco mais expectativa como antes. E percebi que é isso mesmo, as pessoas estão indo e vindo sempre, entram e saem de nossa vida, como tudo em movimento. EStou aprendendo a me permitir aprender com cada situação e desapegar qdo é necessário.
    Obrigada por esta reflexão!!

    • responder Thais Marques 02/11/2016 às 19:40

      Isso mesmo, Xica! Expectativa é um treco complicado – precisamos viver mais leves e aproveitar (num bom sentido) o que cada pessoa é capaz de nos oferecer. <3 Beijo!

  • responder Isabela 16/10/2016 às 12:18

    Primeiramente parabéns pelo lindo texto! Super me identifiquei! No colegial tive muitas amigas, tinha aquelas que fazíamos tudo juntas, mas com o tempo nos afastamos e hoje nem nos falamos mais. Picuínhas, fofoca, gente mal intencionada, era o que mais tinha, e hoje também tem.. Mas aprendi que para ser amiga não precisa estar sempre grudada, mandando bom dia, boa tarde e boa noite, e que cada uma tem a sua vida, mas que uma hora ou outra a gente se encontra e parece que nos falamos ontem mesmo.. Tenho uma amiga desde a pré-escola, são mais de 20 anos de amizade, já mudei de cidade/estado, já ficamos meses sem nos falar, mas sempre algo nos junta novamente, e hoje em dia trabalhamos juntas! Não temos um milhão de fotos juntas, mas temos aquelas que nos faz lembrar que nossa amizade começou antes mesmo de imaginarmos, pois a mãe dela saindo da maternidade encontrou a minha dando entrada, e ali nós já nos encontramos pela primeira vez! Amizade é isso, é estar perto mesmo que distante e valorizar todos os momentos e pessoas que querem nosso bem e nos fazem bem!!

  • responder Daniela 16/10/2016 às 16:28

    Oi, Thaís! Adorei o texto e é desse jeito que eu penso! Algumas amigas falam de friends forever e de TER que se visitar todo ano e eu penso diferente… Vejo amizade dessa forma mais leve, sem obrigação. Gosto de estar junto porque gosto e quero, não porque tenho que.

  • responder Zilandra Batista Rodrigues 16/10/2016 às 22:21

    OLHA ENHO 35 ANOS ESTOU SOLTEIRA E MORO COM MEUS PAIS, APESAR DE SER INDEPENDENTE FINANCEIRAMENTE, E OLHA ESSE POST CONCORDO EM GENERO NUMERO E GRAU
    BEIJOSSS

  • responder Michele Bdz 17/10/2016 às 07:44

    Adoro demais textos reflexivos assim… que nos fazem parar, respirar e ver que há pessoas que pensam como a gente…

    Amei seu texto, pq penso exatamente assim..

  • responder Maíra S. 17/10/2016 às 09:01

    Excelente reflexão, Thaís! Quando mais nova eu também pensava que amizade era sinônimo de exclusividade e intensidade. Hoje tenho tido o prazer de “receber de volta” algumas amigas e redescobrir coisas em comum. Mesmo que o encontro se dê uma vez por ano, continuo sentindo a ligação com elas e sabendo que a amizade continua mesmo nos períodos de ausência. Com outras, sei que a ligação termina e o que fica são as boas lembranças do tempo de convivência. Mas o que tem me encantado mesmo é o entendimento de que podemos ter diversos tipos de amizade, cada uma de um jeito, e que isso sim enriquece a vida. Não é com toda amiga que vou querer abrir meu coração e falar das coisas mais íntimas, como eu achava antes. Tem amiga para falar de maquiagem, para praticar esporte junto, para falar de ativismo social ou literatura… E assim, nós mesmas ficamos menos engessadas e vamos aprendendo um pouquinho com cada pessoa que passa na nossa vida.

    • responder Thais Marques 02/11/2016 às 19:43

      Maíra, onde assina pra concordar 100% com seu comentário? PERFEITO, adorei! <3

  • responder Juliani de Paula 17/10/2016 às 16:34

    Thais, que texto bom!
    Nunca tinha parado pra pensar nisso! Eu nunca fui de ter várias amigas, mas sempre tive uma melhor amiga extamente como você descreveu, uma simbiose cansativa.
    Uma delas casou, outra fez um intercabio e agora ta namorando. E nossa relação ta ainda melhor, pois eu to tendo oportunidade de fazer novas amizades!

  • responder Flavia 17/10/2016 às 16:54

    É verdade, fui aprender isso com quase 30 anos. Distribuir amor por ai. Ter várias amizades, sem distinção. Umas em mais sincronia que outras… e a vida segue.

  • responder Julia Kubrusly 18/10/2016 às 00:59

    Eu muitas vezes fico triste pensando nas pessoas que a vida leva… uma ou outra foi por briga, mas a maioria só se afastou naturalmente e hoje não tem nada a ver… Às vezes tento reaproximar, mas se não tem a ver, não tem a ver, não tem como forçar… Mas fico muito feliz também com as novas amigas que surgem, sempre tentando harmonizar as coisas.
    http://www.issoaquiloetal.wordpress.com

  • responder Silvana 18/10/2016 às 14:57

    Olá, Thaís,

    Obrigada de todo o meu coração por este texto. Acredite, eu já desfiz e mandei pra longe algumas amizades e até familiares que realmente não entendem o quão necessário é termos essa “divisão saudável do amor e do tempo”.
    Obrigada!

    Beijos!

  • responder Miriã Andrade 20/10/2016 às 21:22

    Eu e minhas amigas amávamos as Spice Girls, mas eu era a Emma, hahaha. Adorei, Thais! 😉

  • responder marcia 21/10/2016 às 11:59

    Emocionada com o texto, pois No auge dos meus quase 50anos também continuava achando que amizade era uma coisa eterna. Para mim deveria ser fazer tudo junto, querer tudo junto, sonhar junto, decidir junto, partilhar e compartilhar pensamentos, idéias e ideais…… Ah, mas o cruel tempo passa e a gente se decepciona e também decepciona o outro. A vida é assim, simples assim, nós é que complicamos tudo. Ah, como dói, dói muito, mas não se pode ser uma simbiose do outro né! Isso não existe e um dia a conta chega esfregando na nossa cara. Hora de aprender a seguir, aprender que cada pessoa é diferente, que pode estar junto e tão longe, que pode não ser tão fiel e muitas vezes bem cruel; aprender que o leque pode ser muito maior, então por que restringir?

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